A CNTA (Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação), a Contac CUT (Confederação Brasileira Democrática dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação da CUT) e a UITA (União Internacional dos Trabalhadores) lançaram, nesta terça-feira (18), a campanha “A Carne do Trabalhador”, focando a alta contaminação pela Covid-19 nos frigoríficos brasileiros. A campanha denuncia a inércia das empresas e do governo federal sobre o tema; uma greve não está descartada.
O material completo da campanha você pode baixar AQUI (nenhuma peça desse material pode ser editada ou modificada).
O lançamento ocorreu durante coletiva virtual de imprensa, pelo aplicativo Meet. De acordo com estimativa das entidades, colhida junto às unidades de frigoríficos de todo o país, cerca de 25% dos 500 mil trabalhadores do setor foram contaminados pelo Coronavírus. Um número que ultrapassa 120 mil pessoas, sem contar os familiares destes trabalhadores, e as comunidades onde residem.
“Em todo o mundo, os frigoríficos são focos importante da pandemia, mas países como a Argentina têm uma situação muito diferente do Brasil. Lá, as empresas e o governo estão em diálogo permanente com os sindicatos para interagir sobre o problema”, comentou o secretário regional da UITA para a América Latina, Gerardo Iglesias, no início da coletiva.
“Parte das empresas está produzindo com uma atitude de total desrespeito à saúde do trabalhador. Estão faturando com esta crise, já que o setor lucra mais que antes da pandemia. Esta campanha tem de falar com a sociedade, falar que esta carne consumida tem sangue do trabalhador”, criticou o presidente da Contac CUT, Nelson Morelli.
“Já no início da pandemia, ao saber que este setor não poderia parar, reunimos as entidades e definimos ações preventivas. Além das medidas de higiene, estabelecemos as aglomerações como o desafio principal para combater o problema, encaminhando ofícios ao governo federal, deputados, senadores e STF. Infelizmente, não obtivemos nenhum retorno positivo”, apontou o presidente da CNTA, Artur Bueno de Camargo.
SITUAÇÃO
A maior parte dos grupos econômicos se fixa no protocolo elaborado pelo governo federal, que estabeleceu regras lenientes de controle da pandemia no interior das empresas. Entre elas, o afastamento de apenas 1 metro entre os trabalhadores, medida sanitária que serve para o trânsito nas cidades e espaços abertos, mas fica inoperante no interior de uma empresa (os sindicatos reivindicam afastamento de 2 metros). A testagem em massa, pleito das entidades e que identifica também os contaminados assintomáticos, foi item desprezado no protocolo governamental.
A ocupação de apenas 50% de trabalhadores nas fábricas, mediante a criação de turnos, é uma bandeira das entidades que, também ausente no protocolo do governo federal, passou a ser desprezada pelas empresas. Criticado duramente pelo MPT (Ministério Público do Trabalho), o regramento do governo segue responsável pelas contaminações, e até pela perda da credibilidade comercial brasileira no exterior – como na recente e mal explicada denúncia da China sobre exportação do frango brasileiro.
Ante pergunta do repórter da Revista Globo Rural, Cleyton Villarino, sobre a falta de testagem nas empresas, Artur Bueno de Camargo reforçou a importância da prática para a prevenção, e lembrou que a empresa que mais testa é a BRF, com apenas 10% dos empregados sendo submetidos ao procedimento. “Estes trabalhadores têm contato com a sociedade onde residem. Podem se contaminar fora e trazer o problema para dentro, ou vice-versa”, respondeu.
A repórter da Agência Sindical, Cinthia Ribas, questionou a alegação das empresas para não realizar a testagem. “A JBS recusa qualquer diálogo. Outras, respondem que cumprem o protocolo. O grande problema é que o governo federal deu uma carta branca às empresas, ao não obrigar a testagem em massa dos trabalhadores”, respondeu o presidente da CNTA.
“Além da precariedade dos protocolos, há abusos ainda maiores nos bastidores. A JBS obriga o trabalhadores a utilizarem uma mesma máscara por 5 dias”, comentou Nelson Morelli. “O regramento é um suicídio para o trabalhador, elaborado para favorecer os grandes grupos econômicos”, continuou.
A jornalista da CUT, Vanessa Ramos, questionou as entidades sobre a recusa específica da JBS para o diálogo acerca das medidas de prevenção. “Em março, encaminhamos um ofício a todas empresas, e de modo geral o retorno é sempre muito difícil ou quase ausente, com destaque para a JBS. Em agosto, nova tentativa foi realizada e mais uma vez nem sequer uma resposta foi dada”, explicou Artur Bueno.
Ana Paula Rosa, da Rádio Educadora de Limeira, questionou a situação da Covid no setor de frigoríficos da região. “Temos poucas empresas na região, plantas menores e um ritmo menos acelerado de produção”, afirmou Artur Bueno. De acordo com a CNTA, isto reduz pela metade o índice de contaminações, com relação aos grandes conglomerados.
CAMPANHA E GREVE
A jornalista da Agência Bloomberg, Tatiana Feitas, questionou a expectativa das entidades sobre o alcance da campanha “A Carne do Trabalhador”. “Quanto às empresas, vai ser preciso sensibilizar. O alvo é a sociedade. É preciso mostrar à dona de casa que a carne que ela consome é fruto de uma situação insustentável dentro dos frigoríficos”, continuou Nelson Morelli.
Tati Freitas levantou a possibilidade de uma paralisação no setor, hipótese que foi destacada pelas entidades. “Se não obtivermos retorno com estas ações, será inevitável debatermos a possibilidade de uma paralisação das atividades”, afirmou Artur Bueno.
As peças publicitárias da campanha “A Carne do Trabalhador” estampam a frase de impacto, associada à figura de trabalhadores no ambiente dos frigoríficos. Ao mesmo tempo em que faz a crítica, apresenta reivindicações para minimizar a contaminação: testagem 100%, fim das aglomerações e EPIs adequados.
Peças para mídia exterior, rádio e redes sociais formam o portfólio de materiais que serão personalizados com as marcas de cada sindicato ou federação participante. Dessa forma, essa ação coordenada terá mais capilaridade, chegando aos grandes e pequenos municípios do país inteiro. Com apoio da UITA, entidade internacional, os materiais estão ganhando versões em espanhol e inglês, para facilitar a difusão em outros países.